Por: Professora Amanda Borella (Instagram: @amanda_borella)
Quando usamos a expressão Lugar de Fala, imediatamente vem à mente o livro da filósofa Djamila Ribeiro (veja aqui o instagram dela). Em síntese, a obra de 2017 apresenta um panorama histórico das vozes que foram historicamente interrompidas. Como assim?
Bom, para ela:
“[…] a razão é que vimos a necessidade de contribuir para um debate mais saudável, honesto e com qualidade. Acreditamos que discussões estéreis e dicotomias vazias que se balizam por ‘é um conceito importante ou não é?’ tentam encerrar uma teoria em opiniões ou inversões lógicas. E o mais importante: há a tentativa de deslegitimação da produção intelectual de mulheres negras e/ou latinas ou que propõem a descolonização do pensamento. O propósito aqui não é impor uma epistemologia de verdade, mas de contribuir para o debate e mostrar diferentes perspectivas.”
(Djamila Ribeiro, em Lugar de Fala, 2017)
A partir disso, é possível questionar: quem tem mais chances de falar (e ser ouvido) na sociedade?
Um olhar atento sobre a organização nosso sistema de educação, ainda que seja em termos regionais, nos mostra que as minorias (grupos marginalizados na sociedade, que podem, ou não, ser a maioria da população) ainda ocupam poucos espaços políticos. Além disso, são menos representadas em todas as formas (politicamente, culturalmente…). E, por consequência, são vozes menos ouvidas.
É nesse momento que entra o lugar de fala.
Djamila, em seu livro,explica que essa hierarquia estruturada na sociedade faz com que as produções intelectuais, saberes e vozes desses grupos marginalizados sejam tratadas de modo inferior, fazendo com que as condições estruturais os mantenham em um lugar silenciado.Agora eu chego no meu ponto de discussão: as professoras que atuam na educação do Estado de São Paulo. Elas, ao meu ver, ainda são silenciadas em suas casas, na sua família, na sociedade em que ela vive e no local onde ela trabalha.
O papel da educadora/professora já é conhecido em toda a sociedade, mas ela não tem esse lugar de fala em momentos importantes. Por vezes, o trabalho da professora não é reconhecido e a sua fala não é respeitada numa simples reunião pedagógica, por exemplo. A sociedade ainda é muito patriarcal. Na mesma reunião do meu exemplo, ouve-se mais o professor de história sem mestrado do que a professora doutora. E mesmo que a coordenação tenha uma mulher no comando, é comum que esta aceite comodamente que o professor passe por cima da fala de uma professora.
O lugar de fala e o debate
Para tirar dúvidas: o lugar de fala, de Djamila Ribeiro,seria um pretexto para evitar o debate?
Não! Mil vezes não! O lugar de fala não se trata de calar ninguém, mas de abrir espaço para que diversas vozes sejam ouvidas e levadas a sério:
“O lugar de fala traz, na sua essência, a consciência do papel do indivíduo nas lutas, criando uma lucidez de quando você é o protagonista ou coadjuvante no cenário de discussão. Não há silenciamento de vozes, na verdade é justamente nesse ponto que queremos avançar. Traz uma liberdade para cada grupo se reconhecer e entender em qual espaço se encontra conforme o processo de organização e falar com propriedade a partir dele.”
(Giselle Marques, Coordenadora Regional da Rede Estadual de Afroempreendedorismo, em Santa Catarina)
Ou seja, o objetivo aqui não é restringir a troca de ideias, encerrar uma discussão ou impor uma visão. Mas sim, expressar o meu entendimento sobre este lugar que almejo ocupar, não sozinha. Ouvir a outra pessoa deveria ser a ação mais praticada num debate. Principalmente se a outra pessoa for uma mulher. E, no caso no meu texto, uma professora.
Para encerrar, o objetivo deste texto foi identificar o que é lugar de fala e mostrar que ele não serve para restringir a fala de ninguém, mas valorizar quem é pouco escutado. E também para dizer que as professores do estado de São Paulo fazem parte do grupo de pessoas com pouca ou nenhuma voz. Com tudo isso, no dia a dia, nós educadores podemos prestar mais atenção ao lugar de fala das professoras.
Por quê? Para evitar o silenciamento das mulheres profissionais de educação.
Acredito que só assim (ouvindo)construiremos uma sociedade mais justa e igualitária e, consequentemente,teremos uma educação que alcançará a equidade.
Quem é a autora?
Amanda de Morais Borella é Professora da Educação Fundamental II e do Ensino Médio. É Licenciada em História, Geografia, Filosofia e Sociologia, atua nas escolas estaduais do ABC, em São Paulo, faz parte da Recriar Acompanhamento Escolar & Orientação Pedagógica. Também é formada pelo Universidade do Grande ABC, pós-graduada em Gestão Escolar, já atuou em escolas estaduais e na rede particular de ensino, além de possuir cursos de extensão na área de educação.